19.2.06

Regresso ao passado

Penso que já ninguém se lembra, mas, nos primórdios deste blog, levantei a polémica sobre a falta de reedições de discos de música Portuguesa em CD. Alguns comentaristas aproveitaram para me perguntar o motivo de haver, também, falhas nas reedições de repertório dos UHF. Na altura, em relação aos UHF, as explicações possíveis foram dadas. Falei em concreto, nesse texto, de 3 discos que me ajudaram a crescer:

Veneno – Peste&Sida
Portem-se Bem – Peste&Sida
Censurados – Censurados

Estes trabalhos são para mim os 3 melhores discos Portugueses de Punk. O único que ainda tenho em vinil é o “Portem-se bem” dos Peste&Sida, pois, os outros dois terão sido “emprestados”, pelos vistos, a longo prazo, a algum “amigo”…

Numa das últimas semanas, o jornal Blitz trouxe-nos, na minha opinião, o melhor deste discos. “Censurados” dos Censurados é um disco ingénuo, cru, mal tocado, com mau som e rebelde a dar com um pau!!!
Voltar a cantar estes refrões fez com que desse uns pulos na minha sala com a aparelhagem aos berros! Que se lixem (para não dizer outra coisa) os vizinhos durante meia hora que eu agora quero é curtir!!!


- Angustia
- T`andar de Mota
- Animais
- Srs Políticos
- Não
- Tu o Bófia
- É difícil
- Instrumental
- Não vales nada
- Guerra Colonial
- A minha Vida
- Censurados

A maioria destas 12 letras estão ainda hoje actuais, o que é incrível, se tivermos em conta que a edição original deste trabalho é de 1990.
Ainda me lembrava de cor e cantei sem qualquer hesitação: “Angustia”, “Animais”, “Tu o Bófia” e “É difícil”.

António Côrte-Real

9.2.06

Foi você que pediu um "boom"?

A música portuguesa encontra-se repleta de novidades e de projectos estimulantes e originais. Porém, encontra-se sem espaço para crescer porque muita desta produção não chega aos ouvidos do público consumidor. Esta constatação não é de agora e tenho-a referido, insistentemente, nos últimos anos. Todavia, na última década, a pouca divulgação das rádios e o fenómeno da pirataria têm acelerado um processo deveras negativo para os nossos músicos e compositores.

O mercado continua a permitir digressões dos artistas conceituados, o que faz com que se viva numa aparente normalidade. Nada mais enganador porque são raros os novos nomes que conseguem furar, na árdua tarefa de construir uma carreira. Debalde algumas oportunidades concretizadas com operadoras de telemóveis, poucas excepções têm confirmado a regra. Vivemos, no presente, de muitos projectos com passado e que, graças à dimensão que detêm, conseguem permanecer activos.

Mesmo sem entrar na área da pirataria – que, além das desvantagens, também encerra factores positivos ao nível da divulgação – estamos claramente carentes de um novo modelo radiofónico e de uma nova legislação que fomente a produção nacional e a sua promoção e consolidação. Essa legislação não devia ser apenas uma “quota na rádio” - cega e que trata todas as estações por igual, quer se trate de uma rádio virada para música de dança ou para a informação - mas ir muito mais além.
Para que não subsistam dúvidas, devo reafirmar que concordo com as “quotas” nas condições excepcionais em que as coisas estão e, sobretudo, para as rádios generalistas que possuem um alvará atribuído pelo Estado português. Eu posso abrir uma discoteca ou uma editora, contudo, não poderei abrir uma rádio nacional, a menos que adquira uma das existentes. Alguma contrapartida deve ser dada em prol da nossa cultura colectiva. Mas, já não concordo tanto com esta medida para rádios especializadas e com franjas de público minoritário. Agora, uma coisa é óbvia. Não é admissível que a música portuguesa tenha um peso nas vendas e outro, bem menor, na elaboração das diversas playlists das rádios generalistas. Isso é um contra-senso que tem de ser modificado. Preferia é que o tivesse sido a bem e sem necessidade de novas leis porque o “ambiente” de uma obrigação pode não surtir os efeitos desejados.

Não obstante, a lei devia ir bem mais longe. Devia passar pela famosa questão do IVA sobre a música (discos ou instrumentos), como produto cultural e com taxa reduzida, assim como devia estipular a obrigatoriedade de instituições públicas, nomeadamente autarquias locais, contratarem novos projectos para as primeiras partes dos espectáculos de artistas consagrados.
Não se compreende que uma Câmara Municipal “invista” 5 mil contos num artista de topo para agradar aos seus munícipes e eleitores (sobretudo em anos de autárquicas) e não “aposte” 200 contos numa banda em início de carreira. Uma mudança a este nível implicaria uma enorme transformação nas digressões dos novos grupos que passariam a ter público (qualquer festa municipal tem toda a população em peso) e tocariam em condições técnicas que lhes possibilitariam desenvolver o seu potencial.

Com a rádio a passar projectos novos e com os grupos a conseguirem mostrar, ao público, os seus trabalhos, uma nova realidade estaria a emergir.

Ainda assim falta “qualquer coisa” em questão dos media. Pois, então e a televisão?
A televisão é, definitivamente, um motor essencial em toda esta problemática. Basta recordar a importância das telenovelas portuguesas na promoção de discos e de músicos. Claro que as telenovelas não preenchem todas as necessidades! Faltam os programas de música, as emissões e os especiais dedicados à nossa cultura – teatro, cinema, pintura, literatura, música, etc.

A recente comemoração dos 25 anos da febre de sábado de manhã mostrou que este modelo de programa televisivo poderia ser uma realidade com qualidade e audiência. Da mesma forma que, em 1980/81, Júlio Isidro conciliava artistas consagrados com os novos músicos, também, nos dias de hoje, tal poderia e deveria funcionar.

A receita utilizada por Júlio Isidro não parece ter perdido a validade e muito se pode ainda esperar dos ensinamentos deste senhor da nossa comunicação social.
Haja vontade e talento em conseguir levar por diante projectos sérios de divulgação televisiva dos nossos artistas.
Estou certo da receptividade que o público vai dispensar a programas bem estruturados e apresentados, pelo que somente necessitamos de dar o “primeiro passo”.
Será que Júlio Isidro vai surpreender e ficar, uma vez mais, ligado ao lançamento de uma nova geração de nomes?

Em 1980/81, tivemos um “boom” e, actualmente, poderemos ter uma nova explosão.
Estamos adormecidos e temos de acordar.
Temos projectos com imenso valor nas gavetas e nas garagens deste país.
Precisamos de uma nova febre de música portuguesa neste cantinho chamado Portugal.
Bastará saber acender o rastilho.
Será pedir demasiado?


Luís Silva do Ó


Como curiosidade, deixo aqui um segmento do último programa Atlântico, em que foi apresentado um especial dedicado à “Febre de Sábado de Manhã” e onde consta um depoimento de Júlio Isidro.