29.3.06

Resmas de má qualidade

Ora bem…
Sempre que se fala de música portuguesa, e no “esgrimanço” de argumentos, há sempre quem puxe para vários lados: as culpas, os méritos, as negligências…
Há, no entanto, uma premissa que nunca vi assumida, mas que me parece fundamental.

(Este raciocínio resulta de anos em garagens com bandas da mais variada proveniência estética, acompanhá-las ao vivo, gravá-las em estúdio, etc. Ora sigam…)

Se escolhermos uma banda portuguesa de garagem, que entre todos nós seja evidente a falta de qualidade ou nível ou, melhor ainda, uma banda que possamos assumir sem problemas que é má, que toca mal, que tem más canções, que tem má cena.
Se pegarmos nessa banda, e fizermos uma gravação, também má; se fizermos um CD com mau design e má apresentação… uma coisa que nos pareça a nós - que somos razoavelmente esclarecidos - MAL.

De seguida, marcamos uns concertos aos gajos. Sítios onde eles possam apresentar a sua “cagada”. Anunciamos a “tour” de apresentação por blogs, jornais, rádios, etc.

A conclusão que vamos tirar (e aposto…) é que nesses concertos vai haver gente que vai gostar, e esses vão falar com a banda e vão-lhe dizer que gostam, vão comprar o disco, vão levar para casa, ouvir, mostrar aos amigos; os amigos vão também gostar e passar aos seus amigos, and so on, and so on…
A banda, vai ouvir muitas vezes o usual… “Vocês têm muita qualidade”, “Como é que as rádios não passam a vossa música?” “Como é que nenhuma editora pegou em vocês?” “Este país é sempre a mesma merda!” “Porque é que vocês não vão tocar ao Sudoeste?”…

Ora bem, ora bem…
Mesmo não querendo ser mauzinho, eu digo (mas quem sou eu, dizem vocês… e muito bem) que destas bandas há muito por aí…
E temos muita linha escrita, e muito minuto de airplay e muito “passa a palavra” com bandas assim.
Com um bocadinho de sorte, os nossos rapazes, vão ter inúmeras referências na imprensa e rádios.

Ora bem, ora bem...
E quando, se estiver a discutir musica nacional e os seus problemas, os nossos rapazes, poderão, com alguma legitimidade, apontar o seu caso de inúmeros concertos, críticas positivas, encorajamento, referências na imprensa e no entanto, nem rádios nacionais, nem editoras, nem estrelato!
Serão, portanto, vítimas de um País que não reconhece os seus artistas e a sua cultura, ou apenas UMA MERDA????

Por difícil que vos pareça este exercício, por experiência própria vos garanto que já vi isto acontecer, à minha frente, muitas vezes.
Daí a minha postura pouco típica e pouco amada entre os meus colegas músicos.
Eu aceito que muitas músicas não entrem em playlists ou muitas bandas não consigam contratos, etc. E não coloco os meus projectos ou aqueles em que trabalhei fora deste raciocínio. Daí que muitas vezes quando levo com o tal “vocês têm muita qualidade” ou “Porque é que nenhuma editora aposta em vocês?” ou “isto devia passar na rádio” eu vou respondendo com um seráfico “talvez não passe porque não é suposto” ou “talvez não tenha editora porque não devia ter editora”.

Este raciocínio (entre outros mal amados) levou-me a colocar o seguinte post a propósito da nova lei da rádio num Fórum muito interessante (http://www.divergencias.com/)


“música é música, ou seja, alguém por esse mundo fora ker saber se os Abba são música sueca? Se a Bjork é música islandesa? Se os Rammstein são música alemã? Se os Air são música francesa? Se os Pizzicato five são música japonesa? Se os Sigur Rós são música islandesa? Se a Kylie Minogue é música australiana? Se os Rasmus são música Finlandesa?

Penso k as respostas são sempre “não”, o que as pessoas querem saber é se é música boa para os seus ouvidos.

Ainda

No futebol temos o conhecido fenómeno dos treinadores de bancada, não estará esta discussão sobre airplay de rádio, a trazer para a ribalta enormes quantidades de playlisters de bancada? (neste caso talvez playlisters de orelha).

Mais

Através de uma pesquisa simples no google ou outro, podemos encontrar por esse mundo fora emissões online de rádios segmentadas, talvez seja interessante procurar as equivalentes internacionais ás nossas nacionais… e veremos que as nacionais, nem estão fora dos parâmetros, e pessoalmente penso, que mtas vezes a vantagem é das nacionais em termos de gosto veiculado.

Isto para dizer que, obviamente, as rádios de maior preferência do público são as que divulgam conteúdos mainstream… nada de novo até aqui, o mainstream é mainstream, porque é abrangente, porque não choca porque chega ás massas.

A pergunta (do espeta a faca)

Teremos nós produção musical mainstream capaz e em quantidade de ser incluída entre o novo single do eminem, a nova dos Queens of stone age, seguida das Pussy Cat dolls, ou dos Linking Park feat Jay Z, ou dos U2, Coldplay, The Killers, etc.?

Não estou com isto a fazer juízo de valores em relação a qualidade praticada por estes nomes, estou só a afirmar, que estes nomes produzem mainstream e por isso são preferidos pelas massas e que as rádios k procuram as massas têm k se mover nestes territórios…

As restantes rádios, são de nichos e esses não são os que agregam as preferências das maiorias… mais uma vez não é um juízo de valor mas sim uma constatação que quem faz música para nichos dificilmente obterá o reconhecimento massivo do seu trabalho.

Em jeito de conclusão

Sejam estes pontos válidos ou não, cabe aos músicos de origem Lusa, a árdua tarefa de fazer música para que quem a ouve não se preocupa ou pondere a origem mas sim apenas se gosta ou não.

Ainda fundamental, perceberem que targets querem atingir e produzir trabalho em função das referências internacionais, sendo que se o objectivo é a massificação do consumo da sua música será fundamental produzirem de acordo com as oscilações artísticas e estéticas aceites pela generalidade dos consumidores.”


Espero ter contribuído para o refreshment destas discussões.
Abraços

Rui Pintado


Além das suas múltiplas actividades ligadas à música, Rui Pintado integra desde Fevereiro os Orangotang. Aqui fica "So", actualmente na playlist da Best Rock e a passar nas 5ªas feiras da Antena 3. Espero que gostem! LSO.


22.3.06

Trabalhadores do Comércio - regresso em breve

No seguimento do sucesso da sua aparição nos 25 anos da Febre, um dos grupos que surgiu aquando do boom do rock português está de regresso ao activo e às edições discográficas. Responsáveis pelo mega-êxito "Chamem a Polícia" (1981) os Trabalhadores do Comércio preparam a edição, para muito breve, de um EP com temas inéditos.





Excerto da entrevista aos Trabalhadores do Comércio, a ser transmitida, na integra, numa das próximas emissões do programa Atlântico.

18.3.06

Júlio Isidro prepara novo programa musical

Nos bastidores do segundo espectáculo dos 25 anos da Febre de Sábado de Manhã, conversámos com músicos e com o autor e apresentador do lendário programa de rádio. Poucos minutos antes de subir para o palco em Matosinhos, Júlio Isidro falou-nos das comemorações dos 25 anos da Febre e do novo projecto que está a preparar.
Baseado na fórmula da Febre, Júlio Isidro projecta um novo programa de televisão em que o apoio à música portuguesa seja efectivo, incluindo a necessária e premente divulgação de novos valores.
Como escrevíamos na crónica, “Foi você que pediu um boom?”, será que Júlio Isidro vai surpreender e ficar, uma vez mais, ligado ao lançamento de uma nova geração de nomes?


Luís Silva do Ó





Excerto da entrevista a Júlio Isidro, a ser transmitida, na integra, numa das próximas emissões do programa Atlântico. Agradecemos à JIP as facilidades concedidas.

13.3.06

Confederação de almas

Os nostálgicos futuristas

Às vezes tem de ser um rastilho a fazer-nos voltar a uma nova explosão. Assim aconteceu, a parte do núcleo duro dos “escritores” e frequentadores do Canal com a “Febre” de Júlio Isidro. Quem partiu para assistir a pensar que estava perante uma emissão do Canal de História, ao serem iniciadas as hostilidades, de imediato se apercebeu de que o sempre bom, reforçado por sangue novo e um impulso, é inspirador para os caminhos que a música tem de traçar. Júlio Isidro continua insuperável na sua forma de comunicar e no papel de divulgação da música portuguesa, ainda que tenha recorrido ao baú, sabe quem como eu viu, que esteve muito para além disso, com músicas novas a serem tocadas e o entusiasmo igual ou maior do que nos clássicos.
A conjuntura foi especial até porque durante a tarde, desse mesmo dia, estivémos à conversa com o John Watts dos Fischer-Z num hotel ali perto do Pavilhão Atlântico, um músico do imaginário, que não teve receios de experimentar coisas novas na sua carreira que além de musical é literária, no que tem uma afinidade também com o nosso amigo António Manuel Ribeiro, um momento de imaginário em plena tarde nublada mas luminosa da grande Lisboa.
Acontece que não é necessário fazer viagens no tempo – apesar de agradáveis como estas – para encontrar exemplos de persistência, constância e coerência numa carreira na música. Basta olharmos para uma série de bandas portuguesas e artistas a solo para vermos isso e, convenhamos, nem todos têm conhecidos nas editoras e rádios – como se isso fosse critério- a maior parte são gente como nós, apaixonados pela música, nada mais. Se se puder viver da arte que se perfilha, tanto melhor.
É também já recorrente e nostálgica a batida nas editoras e nas rádios, sabemos que há alguma falta de largura de vistas e as primeiras têm perdido inclusivamente bons negócios com música que valeria muito a pena, mas alguns têm despontado, todos vemos isso. Não teremos às vezes um velho do restelo a habitar em nós? Também já fiz essa pergunta ao espelho ou num local qualquer... e a resposta às vezes pende para o lado do sim. E mais irritado fico quando me vejo a justificar com a maneira de ser característica da nossa nacionalidade, e mais ainda quando na vez seguinte volto a fazê-lo.


A Rádio Arapuca


Devo dizer que sempre defendi uma quota de cerca de 20% de música exclusivamente de nacionalidade portuguesa nas rádios, excepção feita às em que o formato não o permite de todo. Também que metade dessa música fosse do último ano ou ano e meio. Não são apenas os estudos a que tive acesso, mais o bom senso, acho.
Ora aí está ela, a tão reclamada lei da rádio. Música portuguesa por decreto em airplay, ou melhor, em lista – também temos de ter ter pelo menos 60% de palavras portuguesas no texto.
A Lei aprovada em Janeiro estabelece quotas entre os 25 e os 40%, cabendo ao Governo fixar, todos os anos, o valor das quotas a cumprir.
Depois de várias revisões aí está o texto final. O diploma define como música portuguesa as composições musicais "que veiculem a língua portuguesa ou reflictam o património cultural português, inspirando-se, nomeadamente, nas suas tradições, ambientes ou sonoridades características, seja qual for a nacionalidade dos seus intérpretes." ou aquelas "que não veiculando a língua portuguesa por razões associadas à natureza dos géneros musicais praticados representem uma contribuição para a cultura portuguesa.".
A quota deve ser ocupada por "60% de música composta ou interpretada em língua portuguesa por cidadãos dos estados membros da União Europeia." e "35% de música cuja primeira edição fonográfica ou comunicação pública tenha sido efectuada nos últimos 12 meses".
Lemos o diploma, agora vamos interpretar e fazer futurologia, pela experiência presente de uma década de rádios nacionais e década e meia de locais, conhecendo o que as casas gastam para o bem e para o que podia ser melhor. Uma das primeiras tendências será preencher totalmente o que as quotas permitem de clássicos da naftalina portugueses, outra coisa que irá acontecer é abrasileirar ainda mais as rádios portuguesas até aos 40% da cota de nacionais permitida. A dita música de dois ou três acordes e letra magarefe a que se “convencionou” chamar “pimba” tem terreno fértil para procriar em algumas menos esclarecidas locais, felizmente as nacionais mantêm um certo tino na selecção. Também não é de admirar que os programadores / coordenadores musicais das rádios comecem a ter de fazer muitas contas de cabeça para cumprir a lei escrupolosamente, “ Ora deixa cá ver, destes 25% tenho de passar 60% de europeia portuguesa e mais 5% de portuguesa sem ser. Africana , brasileira, franceses que cantam português, 35% de música nova, aaaahhh onde é que eu ia? Ah, é verdade,o Sting contará?”. Ou até que se puxe ao incumprimento. E de que valor serão as coimas pelo não cumprimento? Uma coisa é certa, é possível passar até bem mais de música portuguesa do que exige a lei. A RDP passa em média 60% desde há algum tempo a esta parte e mantendo nível técnico nas escolhas...
Uma das primeiras coisas que salta à vista é a tristeza de ter de se legislar para se ouvir mais música portuguesa, a seguir vê-se que o que vai aumentar basicamente é a passagem de música brasileira, o que de resto já se nota em algumas rádios. E lá vamos nós, em Espanha pouco toca da América Latina, é mesmo é mais música espanhola. E sem qualquer tipo de preconceito em relação à música brasileira, mas recordem-se que do outro lado do Atlântico música portuguesa não entra e já não é uma questão de acesso, como bem sabemos, nem tão pouco de promoção. Por isso digo que a elevada passagem que existia de música de raiz brasileira já seria mais que suficiente, nem tão pouco invalida programas da especialidade.
Depois há aquela necessidade de contemplar em todos os diplomas legislativos a nossa proximidade com a lusofonia e a Europa, então, peca-se pelo exagero. Cai-se no engraçado de abrir uma possibilidade de outros nacionais da Comunidade Europeia começarem a cantar em português, sejamos realistas, alguém vai preencher este requisito, que não os próprios portugueses?
O problema da feitura de um projecto de lei parece ser recorrente, não se fala com quem percebe realmente dos assuntos, quem vive as coisas, os profissionais e académicos de cada ramo, depois o resultado prático das leis acaba por ser limitado e as intenções que acredito boas não se conseguem substanciar no plano prático, quando abrimos a porta da rádio ou passamos o cartão.
Não seria mais fácil, numa rádio de música e com dosagens de palavra cingidas a 10 minutos em cada hora aproximadamente, à parte de programas específicos, pedir duas músicas portuguesas por hora pelo menos, sempre com uma nova – sem serem sempre as mesmas duas ou três novas – e exigir, tal como se exige conteúdos informativos – planos de divulgação de música portuguesa, com informação específica do tema e spot’s promocionais a discos novos e divulgação no lançamento? E incentivo a programas de música portuguesa ao vivo?
Se calhar os nossos políticos vão aperceber-se do erro quando ouvirem as rádios desformatadas e nem por isso a música portuguesa passar a ser mais ouvida e sobretudo, comprada, que é disso que vivem os músicos e dos seus concertos, do seu trabalho que merece o maior dos respeitos.
A Lei da Rádio não vai fazer com que a música de nichos de mercado toque mais, é pouco provável que se oiça muito mais música nova – onde se ouviu já isto? – e traga mesmo do ponto de vista do incentivo à produção musical mais-valias que cheguem a ser significativas. Contudo, é um primeiro passo, tímido, mas um primeiro passo. Aponto-lhe o dedo sobretudo porque não ousou regular o sector de forma abrangente, limitou-se a tocar ao de leve na música das rádios. Ainda bem que não pode existir lei a decretar a passagem da banda A ou B, o que quer dizer que, a maior parte dos artistas que se queixam de não tocar na rádio vão ficar na mesma, uns injustamente, outros não, como muita coisa na vida. Cada um tem de fazer por si, mas a Lei da Rádio não faz muito por ela, nem pelos músicos portugueses. E as associações de rádios parecem nunca mais adquirir força, para fazerem pelos seus, talvez precisem também de sangue novo.

Confederação

Antonio Tabucci defendia no seu livro “Afirma Pereira” - passado a filme com o brilho da interpretação de Mastroianni e Mário Viegas, entre outros, e música de Morricone e Dulce Pontes- que temos um “eu” dominante que emerge de uma espécie de conjuntos de “eus” que possuímos, uma alma que emerge entre as outras, por ser o caminho. Quem quiser seguir a música, deve esquecer as editoras quando o deve fazer, procurá-las na altura supostamente certa, contar com a sorte, mas quase na totalidade com o trabalho, que foi sempre a forma de se conseguirem as coisas. E o mesmo se aplica às restantes cadeias do elo. Acredito muito na nossa música e nos nossos, que não são piores que os outros, longe disso.
O Canal tem estado de volta. E ainda bem.

Bruno Gonçalves Pereira

7.3.06

Punkpt

Já não faço uma crónica há mais de um ano.

Também, confesso, que nunca foi minha ambição escrever elaboradas crónicas sobre o estado da música portuguesa - que não vai bem. Para isso temos os nossos ilustres cronistas jornalistas, radialistas, músicos...

Dado que a minha vida ainda se mantém ligada a este vasto universo que é a “Internet”, vou recomeçar com o primeiro desafio que me foi feito pelo Canal... Porque para ser polémico falaria na pirataria - algo que já fiz em Dezembro de 2003 - ou na “peregrina” ideia que apoio de distribuição gratuita de música... Talvez a seu tempo o faça…

“Bandas na Web” foi o meu espaço neste blogue dedicado a mostrar bandas por estas... bandas...
E irei tentar, na medida do possível, continuar a divulgar o que vir e ouvir no ciberespaço, dentro da legalidade... Claro está!

Para tal, tenho que falar no Hugo Caldeira... Homem que não conheço e com o qual nada tenho a ver, a não ser visitar o seu espaço na Web. Esse espaço é a prova viva da célebre frase “PUNK IS NOT DEAD”.

Falo, claro está, no site punkpt, onde, graças a ele e ao seu “player”, já ouvi e passei a conhecer música portuguesa e novas bandas de uma onda que vai do punk, punk-rock, passando pelo ska...

Só pela audição já vale a pena passar por lá... mas o punkpt não é apenas um “player”! Sendo um site de design simplista, o importante é o seu conteúdo.

Entrevistas, reviews oficiais e de cibernautas a concertos e festas, fotos, mp3, calendário de concertos, fórum e notícias! Muitas notícias em que o comum visitante tem a hipótese de submeter também a sua e divulgar o que acha que tem que ser divulgado.

Claro que gostos não se discutem e nem todos gostam desta “onda”... Mas quem dera a tantas outras “ondas” ter mais gente a fazer o que o punkpt tão bem faz!

E como o importante é o conteúdo deixo-vos com este link de visita obrigatória:

www.punkpt.com


João Pedro Rei

2.3.06

Duelo ao espelho

“A divagação é o domingo do pensamento”

Os meses passam, os anos instalam-se dentro de nós e caminhamos para onde o nosso pensamento quiser.
A “inspiração” – doce encanto de um instante – pode permanecer sempre à tona da água ou mergulhar sem que se saiba quando regressa à superfície. Cada um tem a sua própria dose daquilo que designa por “inspiração” e a minha não tem estado. Decidiu ir para a neve de férias e eu fiquei por cá tentando vislumbrar o outro lado que passa aqui tão perto.

Os últimos tempos deste espaço têm sabor de quente e frio em pleno Inverno. Longe estão os dias e noites de grandes confusões, dos debates puros e duros, das zangas, dos amuos, das palavras duras, do quase caos lançado por participantes “anónimos” ou “conhecidos” no meio musical, das novas ideias apresentadas e exaustivamente analisadas e criticadas, das embrulhadas que acabaram por ser resolvidas em “off blogue”.

E houve um momento em que o meu tempo deixou de ser elástico para me dedicar a esta causa. Outros desafios, outros projectos, outros sonhos ousaram destronar estas horas de escrita. O mesmo terá sucedido com muitos dos cronistas e o efeito inverso à bola de neve inicial fez-se sentir.

Estamos, agora, num momento de retorno. Os regressos nem sempre são fáceis de viabilizar porque podem ter sabor de água que já passou por debaixo da ponte.

A situação da nossa música permanece semelhante. E nós ainda seremos os mesmos?


“A inconstância deita tudo a perder – ela não deixa germinar nenhuma semente”

Os queixinhas e os desesperados são uns tipos muito chatos.
Aborrecem-me imenso e nunca tive pachorra para suportar aqueles que só sabem queixar-se de tudo e de nada.
Quando queremos muito uma coisa na vida devemos lutar por ela mesmo que se afigure semelhante a um Adamastor quinhentista. Bartolomeu Dias já nos mostrou ser possível dobrar cabos complicados.

Tenho estado a ler “Crónicas – volume 1”, o livro de Bob Dylan onde nos conta experiências pessoais e onde se viaja deliciosamente no espaço e no tempo.
Muitos aspirantes a músicos deviam ler este livro; igualmente, muitos músicos reformados e/ou criativamente estagnados o deviam fazer.
Abrem-se janelas de determinação e de redescoberta em muitas destas páginas.

Dar conselhos não será concerteza o meu objectivo neste blogue, porém, creio que quem quer ser músico tem de acreditar no seu talento e tem de lutar até o conseguir provar. Muitos jovens têm o talento inato da criação musical, mas falta-lhes o foco porque são inconstantes. Perdem-se compositores e músicos excepcionais porque não têm essa certeza de que um dia vão conseguir furar e acabam por desistir de lutar.
Pedro Abrunhosa já não tinha 18 anos quando conseguiu romper o cerco; os Delfins arriscaram tudo, numa fase inicial de carreira, acreditaram e foram para estúdio, pagando a gravação do seu primeiro LP; os Xutos, já com uma legião de fãs, demoraram anos até convencerem uma multinacional a apostar neles.

Estes são casos bem conhecidos na nossa praça, exemplos de persistência, de luta. São músicos reconhecidos que acreditaram no seu valor e conseguiram singrar.
Sei que é fácil falar e, por vezes, é árduo aguentar e continuar a caminhar porque é melhor “ter uma vida” do que ser um “vagabundo errante”.
Conseguir prescindir de “quase tudo” e lançar-se à estrada, em busca de “um momento de sorte”, é uma opção de vida cada vez mais arriscada numa sociedade de consumo imediato.
Contudo, existem outros jovens, menos talentosos, mas mais determinados ou com “maior sorte”, que conseguem singrar no mundo musical.

A vida será injusta ou seremos nós a construir essa justiça?


Luís Silva do Ó

As citações utilizadas nos subtítulos têm como autor Henri Amiel (1821-1881), filósofo e escritor suíço.


Nota: Passaram 10 anos desde que os k2o3 (do nosso amigo e cronista Ulisses) entraram em estúdio para as sessões de "És Capaz!". Um abraço para o Ulisses, Mini, Chaves e Nuno que como todos os grandes amigos estão sempre "Perto de Mim".