Intróito
Numa das últimas semanas, consegui tirar uma semana de férias e caminhei rumo à minha terra.
Como não sou adepto do "ser churrasco", em vez de esturricar ao sol, combinei alguns reencontros de amigos. Assim, num dos dias, em almoço com dois colegas de liceu, um deles (com quem não conversava à bué – também gosto de ser moderno e de usar as novas palavras do dicionário luso) confidenciou-me que a passagem dos anos não o estavam a deixar mais paciente, pelo contrário, estaria a ficar cada vez mais impaciente. Achei curiosa a confidência porque, a 150 km de distância, sinto a mesma coisa em relação a tantos aspectos do dia a dia...
Não entreguei nenhum texto no blogue, no passado mês, pois, considerei que nada havia a dizer. Estava demasiado impaciente e desiludido com detalhes soltos do Verão musical.
Scolari, o verdadeiro português
Felizmente, tivemos o Euro 2004, em futebol, para nos dar a alegria da redescoberta do "Ser Português". Nem que, para tal, tenha sido necessário recorrer às soberbas ideias de um senhor chamado Scolari, que se revelou um digno sucessor dos navegadores portugueses.
O futebol foi bom para muitas maleitas, inclusivé para o ego. Porém, para a nossa música, foi, como se esperava, igual ao litro...
Feira de vaidades
Fóruns de debate, neste país, estão quase sempre condenados ao fracasso.
Começam com bom fôlego, crescem em ideias interessantes e terminam em equívocos e ofensas da treta.
Ao longo destes meses, vivemos estas fases - incluindo comentários muito valiosos, escritos por bloguistas frequentes ou ocasionais – e assisti, satisfeito, a aceso debate entre cronistas e colaboradores do próprio blogue!
A porca torceu – inevitavelmente – o rabo, ao surgirem os primeiros ataques, rasteiros e gratuitos, a cronistas. A essas tiradas de mau gosto, a Administração do blogue respondeu com inúmeros apelos à serenidade. Todavia, apesar dos esforços, o respeito não chegou a comparecer.
Para piorar o cenário, começaram a surgir ofensas entre comentadores.
E foi neste quadro que se consumou a decisão dos últimos dias.
Pessoalmente, por mais disparates que tenha lido (a meu respeito e de outros) custa-me perder o elemento maior, que motivou debates e intensa troca de ideias. Contudo, concordo que, sem regulação, não faz sentido continuarmos uma tarefa de bombeiros voluntários.
Pena é que, por causa de um número marginal de pessoas, todos nós sejamos afectados.
É a vida!
Um mergulho glaciar
Gosto e admiro o trabalho dos Xutos & Pontapés e espero que compreendam que a redacção das próximas linhas não foi feita de ânimo leve. Custou-me muito. Mais de um mês para ser exacto...
Além de outra argumentação pesada, tenho quase todos os trabalhos dos Xutos (incluindo o célebre single "Sémen"), acompanho a carreira da banda, desde o início, e cresci, nas matinés do liceu, a escutar "Barcos Gregos".
Transpira em conversas privadas e públicas - é mesmo opinião corrente - que os últimos trabalhos dos Xutos têm sido menores em relação ao "passado". Ao aproximar-se uma marca histórica – 25 anos –, quis acreditar que a magia desse momento iria funcionar.
A pequena crítica, demolidora, que saiu no Blitz sobre o single, deixou-me incrédulo!
Passadas poucas semanas, a opinião mudou radicalmente e li várias páginas de rasgados elogios, dedicados por este mesmo semanário ao recente "O Mundo ao Contrário".
Quem não conhecia o trabalho, teve motivos para explodir de curiosidade e correr para uma discoteca, no objectivo de adquirir o CD, na expectativa de voltar a escutar um grande trabalho de rock português.
Até aqui, nada de errado. O problema só surge aquando da audição do disco, pois, este álbum é uma sombra, uma fotocópia negra e mal tirada do próprio som da banda.
Para não me sentir traído pelo engano, escutei o CD umas 15 vezes, antes de redigir esta pequena opinião.
Mas, por mais que o escute, as letras soam-me a uma (des)união de palavras, quase sempre ocas e banais, e a música é de uma ausência de criatividade cortante, sufocante e gritante.
No fim de tudo isto, a menos má canção (?) do disco é o tema promocional e nem esse me consegue entrar no ouvido!
É inacreditável que um grupo como os Xutos & Pontapés ouse colocar, nos escaparates, uma coisa destas.
Se isto ocorresse com os Rolling Stones, no Reino Unido, a comunicação social teria dizimado o trabalho. Por cá, o Blitz publicou uma crítica altamente favorável e com um destaque que nos deixa à beira de um ataque de nervos.
São acontecimentos destes que explicam muita coisa, num país onde a música portuguesa tem a dimensão que tem.
Algum puto que compre este disco voltará a gastar dinheiro noutro CD de música moderna portuguesa?
Respeito a carreira da banda, mas, respeitar não é sinónimo de dependência cega e autista.
Músicos
Qualquer reflexão sobre a música portuguesa, em que se abordem os diversos factores e os diversos intervenientes, resulta em reacções exacerbadas por parte de uns quantos. Temos de ser verdadeiros e assumir que alguns músicos são muito interventivos quando chega a hora de olhar para o umbigo.
Seria conveniente que estes músicos percebessem que o mundo não se limita ao seu próprio projecto musical e que existem outros músicos, cada qual com o seu talento.
As capelinhas não fazem sentido, só atrapalham, e esta falta de visão, de discernimento, não pode justificar tudo. Seria mais útil canalizarem as energias numa luta comum, porque motivos cooperativos não faltam para uma sentida reunião.
Mesmo músicos com carreira, por vezes, parecem esquecer-se que a nossa mercearia musical é, mesmo, uma pequena loja de bairro, na qual se necessita de alguma gestão e estratégia, sob pena de falir.
A figura de "gestor de carreira" é essencial, mas, em Portugal, alguém sabe o seu significado?
Alguém consegue conceber a edição deste "tiro no pé" dos Xutos & Pontapés?
Carreiras
Noto que, em Portugal, as carreiras dos diversos grupos e artistas tende a ser neglicenciada... Sem querer particularizar, temos algumas excepções em que a editora funciona como "porto de abrigo" faltando ao nosso meio musical, "gestores de carreira" que saibam dialogar com os músicos e que tracem metas e objectivos a longo prazo.
Um exemplo: no espaço de um ano, um grupo não pode pensar em gravar um disco conceptual, seguido de um disco rock, enquanto o seu vocalista lança um trabalho a solo e se projecta a gravação e edição de um concerto acústico da banda.
Tem de haver uma linha estratégica definida, em relação aos discos, aos concertos ao vivo e à carreira. Isto porque o concerto ao vivo é o cartão de visita para a compra de um disco ou de toda a discografia, assim como, um disco pode ser o "convite" para ir assistir ao vivo a um determinado concerto. Tal como as "placas tectónicas", tudo está ligado e tudo gira em torno de um mesmo objectivo.
Ao contrário de muitos managers "manhosos" que procuram o lucro fácil e imediato ("mastiga e deita fora"), um "gestor de carreira" serve para defender os interesses dos artistas e, por consequência, das próprias editoras.
Frequentemente, o lado criativo dos músicos não lhes permite discernir a melhor direcção, nem a melhor decisão. Quando um grupo em constante crescendo (este é um exemplo bem concreto) opta por um disco mais difícil - menos comercial - num momento como o actual, em que as rádios estão fechadas às apostas, tem de existir o bom senso de assegurar, pelo menos, um single que promova o disco e que o torne conhecido.
Igualmente, é de evitar que, com o intuito de ganhar mais uns trocos, o grupo (ou o seu manager) prefira dar espectáculos com um som e uma luz sofríveis, colocando toda a imagem da banda em cheque...
É que, meus amigos, a liberdade artística é fundamental, mas, depois, não se venham queixar que as rádios não passam temas de muita "qualidade" (o que é afinal a "qualidade"?), embora, sem pinga de chama comercial.
Se discos com temas fortes já não conseguem entrar nas playlists, imaginem o que sucede a um CD sem um único tema orelhudo!
Luís Silva do Ó
Numa das últimas semanas, consegui tirar uma semana de férias e caminhei rumo à minha terra.
Como não sou adepto do "ser churrasco", em vez de esturricar ao sol, combinei alguns reencontros de amigos. Assim, num dos dias, em almoço com dois colegas de liceu, um deles (com quem não conversava à bué – também gosto de ser moderno e de usar as novas palavras do dicionário luso) confidenciou-me que a passagem dos anos não o estavam a deixar mais paciente, pelo contrário, estaria a ficar cada vez mais impaciente. Achei curiosa a confidência porque, a 150 km de distância, sinto a mesma coisa em relação a tantos aspectos do dia a dia...
Não entreguei nenhum texto no blogue, no passado mês, pois, considerei que nada havia a dizer. Estava demasiado impaciente e desiludido com detalhes soltos do Verão musical.
Scolari, o verdadeiro português
Felizmente, tivemos o Euro 2004, em futebol, para nos dar a alegria da redescoberta do "Ser Português". Nem que, para tal, tenha sido necessário recorrer às soberbas ideias de um senhor chamado Scolari, que se revelou um digno sucessor dos navegadores portugueses.
O futebol foi bom para muitas maleitas, inclusivé para o ego. Porém, para a nossa música, foi, como se esperava, igual ao litro...
Feira de vaidades
Fóruns de debate, neste país, estão quase sempre condenados ao fracasso.
Começam com bom fôlego, crescem em ideias interessantes e terminam em equívocos e ofensas da treta.
Ao longo destes meses, vivemos estas fases - incluindo comentários muito valiosos, escritos por bloguistas frequentes ou ocasionais – e assisti, satisfeito, a aceso debate entre cronistas e colaboradores do próprio blogue!
A porca torceu – inevitavelmente – o rabo, ao surgirem os primeiros ataques, rasteiros e gratuitos, a cronistas. A essas tiradas de mau gosto, a Administração do blogue respondeu com inúmeros apelos à serenidade. Todavia, apesar dos esforços, o respeito não chegou a comparecer.
Para piorar o cenário, começaram a surgir ofensas entre comentadores.
E foi neste quadro que se consumou a decisão dos últimos dias.
Pessoalmente, por mais disparates que tenha lido (a meu respeito e de outros) custa-me perder o elemento maior, que motivou debates e intensa troca de ideias. Contudo, concordo que, sem regulação, não faz sentido continuarmos uma tarefa de bombeiros voluntários.
Pena é que, por causa de um número marginal de pessoas, todos nós sejamos afectados.
É a vida!
Um mergulho glaciar
Gosto e admiro o trabalho dos Xutos & Pontapés e espero que compreendam que a redacção das próximas linhas não foi feita de ânimo leve. Custou-me muito. Mais de um mês para ser exacto...
Além de outra argumentação pesada, tenho quase todos os trabalhos dos Xutos (incluindo o célebre single "Sémen"), acompanho a carreira da banda, desde o início, e cresci, nas matinés do liceu, a escutar "Barcos Gregos".
Transpira em conversas privadas e públicas - é mesmo opinião corrente - que os últimos trabalhos dos Xutos têm sido menores em relação ao "passado". Ao aproximar-se uma marca histórica – 25 anos –, quis acreditar que a magia desse momento iria funcionar.
A pequena crítica, demolidora, que saiu no Blitz sobre o single, deixou-me incrédulo!
Passadas poucas semanas, a opinião mudou radicalmente e li várias páginas de rasgados elogios, dedicados por este mesmo semanário ao recente "O Mundo ao Contrário".
Quem não conhecia o trabalho, teve motivos para explodir de curiosidade e correr para uma discoteca, no objectivo de adquirir o CD, na expectativa de voltar a escutar um grande trabalho de rock português.
Até aqui, nada de errado. O problema só surge aquando da audição do disco, pois, este álbum é uma sombra, uma fotocópia negra e mal tirada do próprio som da banda.
Para não me sentir traído pelo engano, escutei o CD umas 15 vezes, antes de redigir esta pequena opinião.
Mas, por mais que o escute, as letras soam-me a uma (des)união de palavras, quase sempre ocas e banais, e a música é de uma ausência de criatividade cortante, sufocante e gritante.
No fim de tudo isto, a menos má canção (?) do disco é o tema promocional e nem esse me consegue entrar no ouvido!
É inacreditável que um grupo como os Xutos & Pontapés ouse colocar, nos escaparates, uma coisa destas.
Se isto ocorresse com os Rolling Stones, no Reino Unido, a comunicação social teria dizimado o trabalho. Por cá, o Blitz publicou uma crítica altamente favorável e com um destaque que nos deixa à beira de um ataque de nervos.
São acontecimentos destes que explicam muita coisa, num país onde a música portuguesa tem a dimensão que tem.
Algum puto que compre este disco voltará a gastar dinheiro noutro CD de música moderna portuguesa?
Respeito a carreira da banda, mas, respeitar não é sinónimo de dependência cega e autista.
Músicos
Qualquer reflexão sobre a música portuguesa, em que se abordem os diversos factores e os diversos intervenientes, resulta em reacções exacerbadas por parte de uns quantos. Temos de ser verdadeiros e assumir que alguns músicos são muito interventivos quando chega a hora de olhar para o umbigo.
Seria conveniente que estes músicos percebessem que o mundo não se limita ao seu próprio projecto musical e que existem outros músicos, cada qual com o seu talento.
As capelinhas não fazem sentido, só atrapalham, e esta falta de visão, de discernimento, não pode justificar tudo. Seria mais útil canalizarem as energias numa luta comum, porque motivos cooperativos não faltam para uma sentida reunião.
Mesmo músicos com carreira, por vezes, parecem esquecer-se que a nossa mercearia musical é, mesmo, uma pequena loja de bairro, na qual se necessita de alguma gestão e estratégia, sob pena de falir.
A figura de "gestor de carreira" é essencial, mas, em Portugal, alguém sabe o seu significado?
Alguém consegue conceber a edição deste "tiro no pé" dos Xutos & Pontapés?
Carreiras
Noto que, em Portugal, as carreiras dos diversos grupos e artistas tende a ser neglicenciada... Sem querer particularizar, temos algumas excepções em que a editora funciona como "porto de abrigo" faltando ao nosso meio musical, "gestores de carreira" que saibam dialogar com os músicos e que tracem metas e objectivos a longo prazo.
Um exemplo: no espaço de um ano, um grupo não pode pensar em gravar um disco conceptual, seguido de um disco rock, enquanto o seu vocalista lança um trabalho a solo e se projecta a gravação e edição de um concerto acústico da banda.
Tem de haver uma linha estratégica definida, em relação aos discos, aos concertos ao vivo e à carreira. Isto porque o concerto ao vivo é o cartão de visita para a compra de um disco ou de toda a discografia, assim como, um disco pode ser o "convite" para ir assistir ao vivo a um determinado concerto. Tal como as "placas tectónicas", tudo está ligado e tudo gira em torno de um mesmo objectivo.
Ao contrário de muitos managers "manhosos" que procuram o lucro fácil e imediato ("mastiga e deita fora"), um "gestor de carreira" serve para defender os interesses dos artistas e, por consequência, das próprias editoras.
Frequentemente, o lado criativo dos músicos não lhes permite discernir a melhor direcção, nem a melhor decisão. Quando um grupo em constante crescendo (este é um exemplo bem concreto) opta por um disco mais difícil - menos comercial - num momento como o actual, em que as rádios estão fechadas às apostas, tem de existir o bom senso de assegurar, pelo menos, um single que promova o disco e que o torne conhecido.
Igualmente, é de evitar que, com o intuito de ganhar mais uns trocos, o grupo (ou o seu manager) prefira dar espectáculos com um som e uma luz sofríveis, colocando toda a imagem da banda em cheque...
É que, meus amigos, a liberdade artística é fundamental, mas, depois, não se venham queixar que as rádios não passam temas de muita "qualidade" (o que é afinal a "qualidade"?), embora, sem pinga de chama comercial.
Se discos com temas fortes já não conseguem entrar nas playlists, imaginem o que sucede a um CD sem um único tema orelhudo!
Luís Silva do Ó