25.2.04

24 ou 25 de Abril?

“(…) Ou pelo contrário, vão aumentar, exponencialmente, os discos em edições de autor, aproveitando as potencialidades da internet e com promoções lideradas e controladas pelos próprios autores?”

Nas últimas semanas, esta frase que aqui escrevi (ver Sem carga de trabalho) tem vindo a martelar-me a cabeça...
Os motivos de tais marteladas são diversos, mas, aponto apenas uns três:
1. Projectos musicais ignorados pelas editoras
2. Reflexões que vou lendo na imprensa e em blogues
3. Conversas mantidas com músicos, produtores e animadores de rádio

Detalhando um pouco melhor, até podemos pensar que as editoras ignoram os novos projectos porque os mesmos não prestam ou devido a não se enquadrarem numa perspectiva comercial.
Contudo, conheço alguns casos paradigmáticos, incluindo músicas que agradam a toda a gente – até a ouvidos habituados a formatos rádio de sucesso, onde as editoras anseiam entrar – e cujos autores nem são dignos de receberem uma resposta.
Ainda recentemente, após um acontecimento cultural, passei pela casa de um amigo (músico) que me contou a forma como dera de caras com um importante executivo, de uma das maiores editoras deste país, a despejar um armário carregado de demos, directamente, para um saco do lixo.
Presumindo que os homens do lixo não fazem uma recolha selectiva e auditiva, que permita recuperar os melhores projectos, todo aquele espólio ficou arrasado pela máquina que mastiga o lixo doméstico.
Será que, entre aquelas centenas ou milhares de canções, não se encontrava um único tema forte, um único projecto com viabilidade, uma única cassete ou CD que viesse a constituir sucesso e do qual a editora pudesse vender milhares de discos?
Assim se perdem talentos, valores e novos músicos na nossa praça.
As editoras andam de tanga e, a cada mês que passa, as coisas parecem piorar.
Onde estão os profissionais que escutam as demos, que vão aos concertos? Onde estão os olheiros?
No mínimo, porque não se editam compilações com os melhores temas encontrados?

O tempo das vacas gordas já acabou, mas, o comportamento das editoras aparenta ignorar esse facto. Recordo-me da (ainda recente) euforia e derrocada das dotcom, com investimentos (?) a serem realizados em momentos suicidas. Quem não quis ver a realidade terminou a chorar o leite derramado.
A geração que controla a maior fatia do bolo editorial é, exactamente, a mesma que já lá estava há 20 anos, que viveu o fim do vinil, a guerra da cassete pirata…
A experiência é importante, mas, a inovação urge, numa indústria cujo futuro comercial não pode estar ligado a projectos passados.

Esta dança, bera e triste, da destruição de projectos no embrião, tem aniquilado muitos grupos, mas, em 2004, cimentam-se novas tendências e novas soluções, com viabilidade económica para os músicos.
As edições de autor – só para ricos em outros tempos – começam a ser uma real solução.
Uma rodela custa uns míseros 80 cêntimos e já se encontram estúdios com muita qualidade e a preços acessíveis. O circuito promocional pode ser usado por qualquer grupo que queira arregaçar as mangas.
O semanário Blitz surge com edições que incluem CDs a preços tentadores, em parcerias várias, numa ideia que, apesar de não ser inovadora, é, provavelmente, a mais importante do ano. Não precisamos de inventar sempre a roda. Aprender com os bons exemplos estrangeiros, também, é uma virtude.

Os circuitos de música ao vivo começam a melhorar, destacando-se o (grande) Porto como motor desta tendência.
A Secretaria de Estado da Juventude podia e devia ajudar, criando um circuito de concertos em todos os centros distritais do Instituto Português da Juventude. Se os jovens gostam de fotografia e de pintura, não gostarão menos de música…

A internet – zona de terror para editores e artistas num mar de pirataria – tem por outro lado, sido usada para divulgar e fomentar as vendas de novos projectos: o espaço que a CDGO.COM criou na sua loja virtual é exemplar dessa dinâmica positiva.
Outra coisa (esta mesma onde estamos agora) tem agitado as águas da net: falo do movimento que os blogues têm assumido nesta questão, fomentando a troca de ideias e aumentando a discussão em busca de novas soluções.

Não estou a defender um oásis porque a situação actual é grave, séria e de crise, mas, é uma crise que pode ser revertida pelos músicos e pelos agentes e managers deste país.

Quase dois meses depois do início de 2004, ainda não entrou nenhum novo trabalho nacional no top de vendas! A indústria discográfica tradicional encontra-se num beco escuro.
Historicamente, são em momentos como o actual, em que existem crises e pontos de rotura acentuados, que as oportunidades emergem.
A necessidade aguça o engenho e nisso a capacidade lusitana é famosa.
Haja imaginação e capacidade de inovação.
Sejamos criativos porque este é o momento, esta é a hora certa, para dar a volta por cima.

Resta saber se vamos ter uma evolução na continuidade ou se acabará por rebentar alguma revolução


[Notas Finais:
1. As editoras não são todas iguais: tanto existem "pequenas" e "médias" que funcionam bem, como outras que funcionam mal; nas multinacionais também não são só maus exemplos - veja-se o caso concreto da EMI/VC, que sabe defender o seu catálogo e lançar, q.b., novos talentos.
2. Apostas em artistas consagrados, que deixaram de ter público e que não vendem, são cruéis para esses projectos, para a editora que perde dinheiro e para o público, que, devido a essas edições, não tem outras de grupos novos mais excitantes.
3. As editoras e as suas opções de gestão são primordiais na indústria da música, mas, constituem, apenas, parte da floresta...]



Luís Silva do Ó, jornalista

23.2.04

Disco: Blind Zero – A Way To Bleed Your Lover (2003 Universal Music)

Todos os textos de António Côrte-Real estão disponiveis no Fora da Garagem


“A Way To Bleed Your Lover” é, a meu ver, um disco fabuloso. É o disco que nos traz ao princípio do futuro dos Blind Zero.

Ao longo dos anos, os Blind Zero, têm construído à sua volta um culto crescente e activo que, espero eu, com este trabalho ultrapasse fronteiras.

Para já, o 1º lugar nos prémios MTV para “Best Portuguese Act” e o 1º lugar na votação dos leitores do Blitz para melhor disco Português de 2003, dizem muita coisa…

“The Down Set is Tonight” conta com a (sempre brilhante!) participação de Jorge Palma. O Saxofonista Dana Colley participa em “No Way, José”, “Flower Lab” e Heartbreak Motel”.

No DVD de oferta que acompanha este trabalho podemos ver o espectacular vídeo de “You Owe Us Blood” acompanhado pelo making of do mesmo. No making of do disco temos acesso uma série de momentos pelos quais uma banda passa quando entra em estúdio, como a montagem, a experimentação e a escolha de material. Assistimos também à interacção músicos-produtor e ainda às participações de Jorge Palma, Dana Colley e da orquestra dirigida por Luís Serdoura. A terminar, temos uma série de fotos, a biografia e a ficha técnica. E mais uma vez, Mário Barreiros e a sua equipa surpreendem na consecutiva qualidade dos discos que dirigem.

Não destaco nenhuma canção em particular pois este disco prima pela qualidade e equilíbrio no todo do seu alinhamento.

Os Blind Zero são, no universo de Bandas Portuguesas que não usa a língua materna como meio de comunicação musical, das que mais toca ao vivo e mais gente atrai para os seus concertos.

Quem ainda tiver dúvidas em relação a este disco, pode visitar em http://www.blindzero.net, a página oficial dos Blind Zero, e fazer uma escuta tema a tema. Foi assim que o descobri, apreciei e depois comprei.

Força!

António Côrte-Real, músico dos UHF



Contactos:

Management: Remédio Santo – 21-3561190 – remediosanto@netcabo.pt

Agencia: M.M + Música – 21-3844439 – maismusica@netcabo.pt

Fan Club: Recognize – Apartado 3807 4306-601 Porto www.recognize.blindzero.net

Site Oficial: http://www.blindzero.net

Blog Oficial: http://blindzeroblog.blogspot.com



Podem ser enviadas demos para:
Papelaria e Tabacaria Piedense - Jubal
A/C António Côrte-Real
Largo 5 de Outubro, nº 65
2800 Cova Da Piedade

19.2.04

Bandas na Web - Parte 1/1?

Foi-me feito um desafio pelo CanalMaldito...

Confesso que tentei aceitá-lo, apesar do escasso tempo que disponho, e fazer uma crónica semanal relacionada óbviamente com Música Portuguesa, mas fora do âmbito musical. Criticar/divulgar websites de bandas.

É verdade que a minha vida é a Web, e que muito poderei dizer sobre este ou aquele site, desta ou daquela banda.

Mas comecei a prever uma série de crónicas com pouco interesse e muito negativista.

Se não vejamos. A minha primeira tentativa foi os Belle Chase Hotel pela surpresa que foi vê-los ao vivo numa primeira parte de Mão Morta algures em 1999/2000. Não posso de todo comentar seja aquilo que for sobre este site, dado que a pergunta que fica no ar é "Mas eles ainda existem?".

Já que falávamos na primeira parte fui ver a 2ª... Mão Morta, um site bem estruturado, que já conhecia e que em nada mudou desde 2001 a não ser alguns conteúdos (actualizados). Área de mp3 sem funcionar, notícias de Dezembro, enfim...

Que orientação seguirei eu agora, pensei... E lá fui eu jogar um pouco on-line... Como o mundo é pequeno (e pelos vistos também a Net) deparo-me com o amigo Purple (o qual conheci através do FRAGLíder sem sequer saber da sua banda) no fantástico Natural Selection.

Pensei "Não é tarde nem é cedo... The FingerTrips". Sinceramente Surpreendido! Bom design, simples, leve, funcional, actualizado... Um mp3 vinha a calhar.. Esperemos que brevemente se concretize! Ou ofereço eu o link para o Mr.Freddy?

A Visitar!

Parabéns aos The FingerTrips, não só pelo bom gosto, como pelo cuidado em manter o site actualizado...


João Pedro Rei, Consultor Web

18.2.04

Os dias contados

Acaba um dos sites que ajudou a fomentar o gosto pela rádio, mesmo a curiosos de outras áreas ou até aos músicos por vezes tão críticos da postura das emissoras dos nossos dias. A Telefonia Virtual faz a sua entrada no mundo dos mitos... ainda me lembro de o João Gobern escrever a propósito do final do CMR “termina a estação que mudou a face da rádio em Portugal”, texto no também finado jornal “Sete”, de boa memória... uma série de coincidências, somos um povo Kodak.

Em sete anos de Telefonia Virtual vimos gente do meio disfarçada de curioso, vimos frustrações de carreiras do campeonato distrital, boa crítica e outra medíocre, mas respirou-se rádio... vimos muita autenticidade também de quem participou e dos mentores da ideia, obrigado por todo este tempo de imaginário sobre o éter. E isso foi bom, diga-se o que se disser e apesar do mercado na vertente dos seus vícios, do tal pessimismo latente e até de dois ou três elementos que dá ideia de quererem formar uma espécie de contra-blog Canal Maldito, pelo menos a avaliar pelas reacções às crónicas. As brilhantes intervenções do Luís Silva do Ó, do António Côrte-Real e de alguns dos nossos comentadores trataram de colocar estes nossos amigos bloguistas no lugar, mas apesar de entender que a rádio seja a má da fita para algumas bandas portuguesas, sei que não é para grande parte, e faltas de respeito não as admito a ninguém. As entrelinhas também são texto, como melhor do que eu sabem os amigos músicos. Gostava de ter visto e-mails dos contra-bloguistas no meu endereço electrónico, mas pelos vistos ficaram pela descarga pública, e pela suposta análise literário-morfológica dos textos de quem aqui escreve... ou nos vislumbrados fundamentalismos com as sondagens... métodos...

A minha visão do Canal Maldito é partilhar e absorver informação, ler as emoções do dedilhar de vivências e sons que ainda têm muito para dar do António Manuel Ribeiro, a força anímica do Ulisses, os dois lados que congrega o Luís Silva do Ó dos músicos e do mundo da comunicação (com a escrita perfaz a quantia de três pólos muito para além de positivos), a fúria iluminada e consciente do Purple, a autêntica cruzada do António Côrte-Real na divulgação de bandas nossas na sequência das suas ideias que me agradam, do incontornável João Pedro Rei e de todos vocês que comentam, espero que sempre pelas ideias e com o respeito que vos é dado e também esperado.

Há quem vá abrindo portas dentro do mundo rádio para que as bandas portuguesas tenham um maior airplay ainda que tal vá contra a vontade do público – alvo. Quem emita dicas para funcionar segundo este sistema que é, naturalmente, aquele que vai vigorar porque a rádio sabe que é o que a faz ter audiências e a médio prazo tornar-se cada vez mais próxima do público e, naturalmente, das bandas portuguesas, sobretudo das que cantam em português. Haverá quem esteja de olhos abertos... feudos na música portuguesa e respectiva difusão taxada a 40% ou perto, com mecanismos de protecção? Tal e qual um imposto? A música portuguesa, toda ela desde que séria e não-só lucrativa, é já de si um valor acrescentado pelo lado bom, não precisa de nada disso, acho. Tal como ninguém é obrigado a ler estes pensamentos sob forma de crónica.

Falo-vos ainda de outro assunto, ao mesmo tempo que se abrem as portas nacionais à música portuguesa, independentemente de se considerar que a porta está perra ou oleada, tomem consciência que ainda se tenta dar às rádios locais um tom profissional, com ideias, programas no terreno, oferta de ajuda de toda a espécie, com conhecimento real que se pretende aplicado, tudo isto em troco de rótulos depreciativos e de considerações no sentido de se achar que uma carreira de perto da dezena de anos nas rádios de maior peso não vai vingar... aposto que depois destes pensamentos pode-se ir preparar o programa em cinco minutos com um gargarejar com Tantum Verde para preparar os gritos com que se apresenta o programa, no qual se toca o último sucesso de Ágata ou Toy... e tudo músicas que inspiram a fantasia de que com as mesmas oportunidades chegam todos ao mesmo caminho e resultado... e pés na terra e olhos para o umbigo, não?!

Nesta como na tão cara questão da música portuguesa e da sua relação com a rádio à séria, as oportunidades somos nós que as criamos... há dias de sorte, como diz o senhor da lotaria? Há pois, mas nada se cria ou sustenta sem trabalho de mérito, e de certeza não é com conversas de maldizer em ambiente de bastidores ou corredores que se faz um homem ou uma mulher com quem valha a pena privar.

Aqui, vou sempre falar de música portuguesa, de rádio e da relação de uma com a outra, que mais do que uma paixão espero que tenha o suporte amoroso, de amizade e companheirismo que é o que sustenta, segundo dizem e acredito, qualquer relação...

Se alusões são feitas a coisas menos boas é porque se faz pressão assumidamente para que seja mais do que certo que estas tenham os dias contados!


Neste texto falo com pesar do final da Telefonia Virtual, com alusões a outros mitos da comunicação e da divulgação de música no nosso país.
Reacção de desagrado pelas intervenções menos respeitosas (poucas felizmente) patentes nos comentários à crónica anterior.
Uma certa visão do Canal Maldito.
Um caminho a par para a música portuguesa e para a rádio.
Algumas peculiares rádios locais.
Relações sustentadas, apesar dos lados menos brilhantes.



Bruno Gonçalves Pereira

17.2.04

AFP: TOP 30 ARTISTAS - SEMANA 07/2004

No top semanal de vendas da AFP saiu "Vivo D'Arte, Vivo D'Amor" de Frei Hermano da Câmara, encontrando-se 6 projectos musicais nacionais nos 30 primeiros.


6º O CONCERTO ACUSTICO (3P) - RUI VELOSO (VIRGIN/EMI-VC)
7º AO VIVO NO PAVILHAO ATLANTICO (3P) - TONY CARREIRA (ESPACIAL)
11º PALCO (P) - PEDRO ABRUNHOSA (POLYDOR/UNIVERSAL)
24º FORA DE MAO (OU) - LUIS REPRESAS (MERCURY/UNIVERSAL)
25º FADO CURVO (P) - MARIZA (VIRGIN/EMI-VC)
26º FOCUS (P) - MORRICONE/DULCE PONTES (POLYDOR/UNIVERSAL)



(PR)-Prata (OU)-Ouro (P)-Platina (2P)-Dupla Platina (3P)-Tripla Platina


Dados: AFP/Copyright AC Nielsen Portugal

Problema técnico

Nos últimos dias temos recebido diversos emails em que é referida uma demora significativa na visualização do nosso blogue e a indisponibilidade de aceder aos comentários.
Tal ocorre em alguns ISP e, numa primeira abordagem o tráfego "encalha" algures num router da MCI - supostamente em Miami - que deverá assegurar link - directa ou indirectamente - para o Brasil.
Provavelmente, noutros ISP as rotas usadas neste acesso internacional serão diferentes e, daí, funcionar.
A confirmar-se esta abordagem, os motivos podem ser vários, mas, sugerimos que entrem em contacto com a empresa que vos presta o serviço de net, referindo não conseguirem acesso ao seguinte site:

http://www.comm.blogger.com.br/

Apesar de alheios, apresentamos as nossas desculpas a todos aqueles que não podem participar com os seus valiosos comentários.
Esta questão tem estrangulado o normal funcionamento do blogue e aguardamos uma resolução rápida...

11.2.04

BLOGUE-SE À FORÇA - Três
Líder e cota ou líder cotado?


Quando em 1978 o embrião dos UHF estava consolidado – eu, o Renato, o Peres e o Américo Manuel – comecei naturalmente a emergir como o puto com voz de comando. Foi assim, digo-vos, ninguém assaltou o poder. Se formos à raiz das coisas e das causas descobre-se sempre o chavão: uns estão melhor preparados que outros, ou, aquele nasceu com um dom. Pois é, eu nasci quatro anos antes que os outros dois (Renato e Peres) e era mais atrevido que o baterista. Esgota-se por aqui o esperado pedigree.
Apetece-me hoje abordar este assunto melindroso para tanta hipocrisia lusa, tanta avestruz de penas anais espetadas no ar. O que é um líder de uma banda rock?
Tornei-me, com esta história da carreira, no líder que foi ficando, que dirigiu os negócios (às vezes muito mal), mas, sobretudo, naquele tipo que dava a cara em todos os momentos e escrevia o repertório, coisa pouca.
Aos 25 anos de idade, ser líder dos UHF (enquanto as outras bandas se desfaziam em salamaleques democráticos), era dar entrevistas a uma voz, ter problemas em explicar isso aos outros (entretanto o Zé Carvalho chegara) e coleccionar os telefones das fãs mais giras. Era também chegar à porta da discoteca e dar a cara para a multidão seguidora entrar, chatear a cabeça do Francisco Vasconcelos e do David Ferreira (chefes da EMI-Valentim de Carvalho), ficar a beber o último copo e, já na rua, descobrir com o Pedro Duarte que me tinham gamado o carro à porta do Snob (tardes de whisky e bifes nocturnos).
Muitas vezes confessei as verdades do interno perigo que era a velocidade desta vida a um jornalista atento e amiúde sacana. Não sou um gajo mal disposto, gosto de uma conversa até nascer um brilhozinho nos olhos, gosto de ser sincero. Dizem, por isso, que sou ingénuo. Mas eu prefiro dizer o que penso e mandar às urtigas o culto da filha putice nacional: a alma é o segredo do negócio (num país sem economia produtiva), sei mais que tu mas é meu (e entretanto morrem sem apelo).
A partir dos 30 anos o líder dos UHF entrou em parafuso com os desamores acumulados (esta história de ser um leão fogoso paga-se caro), perdeu as rédeas e deixou entrar na banda mais invejada e elitista do rock português a tragédia da droga. Ela veio com a arte de alguns músicos que por aqui passaram para encher os bolsos dos dealers da cidade onde nascemos.
Foram tempos difíceis: apanhar os meus cacos emocionais, curar as ressacas do álcool, pôr de pé ensaios e digressões, descobrir os músicos no fim dos becos sujos do desperdício humano. Cheguei a participar com o programa piloto para a recuperação de toxicodependentes do Hospital de Santa Maria, mas, o músico em causa, perdeu-se a meio de uma seringa suja de sangue.
Era o tempo em que uns tipos mais ou menos obscuros começavam a escrever por aí (a maior parte dos pasquins desapareceu). Vi, porque li, a minha morte anunciada nos jornais, o estertor dos UHF, a esponja branca da pequena maldade limpar todo o nosso passado. Mas nunca os vi a assistir nesse tempo a um concerto dos UHF.
Somei erros, continuei líder, levei porrada de malho, e estive à beira de mandar o projecto às malvas por várias vezes.
Foi o tempo em que a política me piscou o olho e eu fui ver como era. Dei-me mal, apesar dos amigos que fiz, porque a política é um jogo de sombras para tudo continuar na mesma, como se a doença diagnosticada fosse incurável, enquanto a malta enche os bolsos da clientela. Mas a política não é um estado crónico de miragens, a política do futuro não pode ser essa derrota lucrativa dos partidos.
Ao longo deste tempo todo fiquei como o resistente. Os outros fundadores haviam partido e as suas histórias, os seus motivos, serão revelados num dia.
Chego agora ao momento das revelações em que me apetece dizer-vos que o líder, este gajo, somava os disparates naturais com o brilhantismo fugaz que nos faz dar um salto de alegria ao ver nascer uma nova canção: a síntese da eternidade pop/rock está toda no tema “Por Três Minutos na Vida”. E era por aí, por essas veredas da criatividade prenhe, que eu vivia e me emocionava.
Mais um casamento e outro divórcio depois, andávamos pelos anos 90. Com uma regularidade certeira, as canções de sucesso tomavam conta das digressões:

“Este Filme” (90);
“Brincar no Fogo” (91);
“Menina Estás À Janela”,
“Sarajevo”
e “Um Copo Contigo” (93);
“Toca-me” (95);
“Foge Comigo Maria” (96);
“Quando (dentro de ti)” (98);
“Uma Palavra Tua”
e “Dança Comigo (até o Sol nascer)” (99).

Posto assim no papel, no ecrã, de uma forma estendida, dá para entender que esta banda trabalhava e o líder, mais do que aturar a corte, escrevia, remexia-se, questionava-se (sempre) e procurava almejar a linha do horizonte: o impossível está lá e só isso me interessa.
É curioso descobrir que dobramos o cabo do milénio com uma jovem formação e uma nova garra instalada: vocês são o reflexo. Estes putos têm metade da minha idade, são bons, e a prova está no apreço que vocês sentem por eles. Fala-se de mim, aqui no blogue, por aqui e por ali outra vez, como se eu, finalmente acordado do torpor milenário, tivesse saído do sarcófago. Olhem que não.
Saí de cena muitas vezes, voluntariamente, larguei a noite e a auto-destruição, virei as costas às capelinhas e borrifei-me para o marquetingue. Assustei amigos, como o Rui Correia, pela exposição de um ideário. Mas não é disso que a malta precisa, que se ponham os nomes aos bois?
Ser líder hoje dos UHF é dizer-vos que as ideias criativas, a visão, é um estado muito pouco democrático, sofrido mas tocante. É acreditar, ser positivo, desafiar as estruturas que se queixam do desaire deste estado de coisas e me parecem as dobradiças velhas de uma porta pesada a abrir.
A música deste país sempre se revolucionou e avançou pela criatividade espontânea dos seus artistas e autores (UHF, Xutos) e um ou outro caso planeado (Táxi, Abrunhosa). Em ambas as situações os artistas puxaram a carroça das editoras e todos ganharam dinheiro, cimentaram uma indústria e calaram um coro de velhas.
Nos UHF, o papel do líder é estar atento ao somatório destes 25 anos de carreira. Tem sido bom tocar a alma de gente anónima como muitos de vós que escrevem para este blogue e saber que a arte tem caminhos direitos por estradas sinuosas – de outra forma não era arte. E esta, se quisermos, pode mudar o mundo com já nos mudou a nós.

Momento final:

Dia 17-01-2004

Hora: 01:46:07

MSG para o meu telemóvel:

“Cada vez gosto mais da lágrima... Uma das tuas melhores criações... Beijinhos té manha”

Da minha filha Carolina (13 anos) para quem, provocadoramente, sou um cota, se não lhe faço as vontades.

11 de Fevereiro de 2004

António Manuel Ribeiro, músico e produtor dos UHF



Duas notas:

Comprem a “Cais” deste mês. É sobre música portuguesa, fala-se lá dos UHF (Nuno Galopim) e os sem-abrigo agradecem.

Para quem esteve em Glória do Ribatejo (24/01) na Festa Motard: “Matas-me Com o Teu Olhar” já está gravado. (O que a paixão nos pode bem fazer)

10.2.04

AFP: TOP 30 ARTISTAS - SEMANA 06/2004

No top semanal de vendas da AFP saiu "Fado em Mim" de Mariza, encontrando-se 7 projectos musicais nacionais nos 30 primeiros.
Destaque para o Disco de Platina, entretanto conquistado, pelo trabalho de Dulce Pontes e Ennio Morricone.


5º O CONCERTO ACUSTICO (3P) - RUI VELOSO (VIRGIN/EMI-VC)
9º AO VIVO NO PAVILHAO ATLANTICO (3P) - TONY CARREIRA (ESPACIAL)
12º PALCO (P) - PEDRO ABRUNHOSA (POLYDOR/UNIVERSAL)
24º FORA DE MAO (OU) - LUIS REPRESAS (MERCURY/UNIVERSAL)
25º FOCUS (P) - MORRICONE/DULCE PONTES (POLYDOR/UNIVERSAL)
26º VIVO D'ARTE, VIVO D'AMOR - FREI HERMANO DA CAMARA (FAROL MUSICA)
27º FADO CURVO (P) - MARIZA (VIRGIN/EMI-VC)



(PR)-Prata (OU)-Ouro (P)-Platina (2P)-Dupla Platina (3P)-Tripla Platina


Dados: AFP/Copyright AC Nielsen Portugal

4.2.04

O Punk na crista da onda

Mais um fim de semana à vista, mais um concerto.
Está na hora de vestir a outra pele, de tirar a camisa desconfortável, de lavar as calças de fazenda, de puxar brilho aos sapatos para a semana seguinte e de escolher a "farpela" que o torna alternativo, irreverente, crítico e participativo.
Arruma cuidadosamente o Jipe que os pais lhe deram no aniversário, faz uns telefonemas e combina com os amigos na paragem do 36.
A noite promete.
Por entre umas cervejolas na tasca ao lado e uns charros bem aviados, ele e os seus amigos vão dizendo mal das bandas que lhes vêm à cabeça e elogiam aquelas que agora é que estão a dar.
As rivalidades pseudo-intelectuais dos esclarecidos do momento imperam e ditam as tendências neste nosso portugal pequenino, fórmulas já gastas, importadas do estrangeiro.
Mas isso não faz mal.
É novo cá, dizem uns, é pura imitação, dizem outros.
A pose agressiva está estudada e os grupinhos marcam território, como se de um campo de batalha se tratasse.
Tudo a correr na perfeição e o concerto começa. É punk, é social, é crítica, mas ninguém entende rigorosamente nada porque a maioria das bandas canta em inglês, o som está péssimo e a voz não se percebe.
No entanto a avaliação é feita com base em quem tocou mais rápido ou em quem conseguiu levar mais amigos.
Tudo bem, há cerveja com fartura e não tarda o pessoal tá todo "besano".
O concerto chegou ao fim e ele está cansado.
Pulou, gritou e quase que andou à porrada, mas sinceramente nenhuma das músicas das bandas ficou no ouvido. Mas não faz mal. Amanhã é outro dia, depois de amanhã há outras bandas e concerteza muitos outros concertos.

Moral da história: O punk, revisto nas mais diversas expressões, seja ele punk rock, punk hardcore, em inglês, português ou japonês, o que for, deriva da mesma essência, do mesmo sentido, de uma atitude revolucionária, reivindicativa. Só assim ganha real valor e só desta forma pode ser entendido como movimento social de extrema importância no passado recente e bem vivo no presente, porque muitas das situações teimam em persistir. O Punk vale pela música, luta por valores e aborda temas sensíveis, e quem deseja subscrever essas ideias deve repensar seriamente determinadas atitudes e, acima de tudo, a forma de estar perante quem também cria, perante "colegas". Quem gostava de punk à 20 anos atrás gosta agora e vai continuar a gostar. O Punk não é nem deve ser uma moda, é tudo menos efémero. Que se diga mal através das músicas, que se critique através das letras mas que todos saibamos estar na música com respeito, seja de que forma for. Com mais ou menos dinheiro pouco importa. É preciso é que tenhamos algo de realmente importante para dizer. Viva o Punk, viva a música.

Ulisses, músico dos K2O3

3.2.04

AFP: TOP 30 ARTISTAS - SEMANA 05/2004

No top de vendas semanal da AFP saiu Camané (Como sempre, como dantes) e voltou a entrar Mariza (Fado em Mim), permanecendo o contigente nacional em 8 projectos musicais nos 30 primeiros:


5º O CONCERTO ACUSTICO (3P) - RUI VELOSO (VIRGIN/EMI-VC)
8º AO VIVO NO PAVILHAO ATLANTICO (3P) - TONY CARREIRA (ESPACIAL)
11º PALCO (P) - PEDRO ABRUNHOSA (POLYDOR/UNIVERSAL)
18º VIVO D'ARTE, VIVO D'AMOR - FREI HERMANO DA CAMARA (FAROL MUSICA)
19º FOCUS (OU) - MORRICONE/DULCE PONTES (POLYDOR/UNIVERSAL)
22º FORA DE MAO (OU) - LUIS REPRESAS (MERCURY/UNIVERSAL)
24º FADO CURVO (P) - MARIZA (VIRGIN/EMI-VC)
30º FADO EM MIM (2P) - MARIZA (WORLD CONNECTION/EMI-VC)


(PR)-Prata (OU)-Ouro (P)-Platina (2P)-Dupla Platina (3P)-Tripla Platina


Dados: AFP/Copyright AC Nielsen Portugal

O Vinho do Porto

Vivemos no país das coisas a posteriori. Já se sabia há muito, é certo, mas para estar de acordo com a doutrina, digo-vos isto apenas agora, a posteriori.

Neste canto à beira mar plantado parece ser criminoso dar-se valor às coisas no seu devido tempo. Está fora de moda. Admitamos que só num país como o nosso se poderia ter inventado o Vinho do Porto, ainda mais que este tem subjacente o facto de se tornar melhor quanto mais velho for. Faça-se agora uma coisa à qual não damos valor e beba-se daqui a uns anos, quando todos lhe reconhecerem o valor. Tornou-se, aliás, lugar comum usar referências a esta situação. Estás como o Vinho do Porto. Estás velho. Estás bom. Claro que isto não deixa implícito que até agora tem sido mau, mas dá que pensar. Ou pode dar.

O bom português, brando de costumes e afiado de língua, é fiel à tradição. O presente é para ele irrelevante. Interessam as glórias do passado e, para alguns iluminados, as possíveis glórias do futuro. Ninguém dá realmente valor àquilo que se tem em mão agora. E nisto contrariamos até os nossos próprios provérbios populares. Porque se prefere ter dois pássaros a voar do que um na mão, no presente, no agora. Esse não presta. Condenemo-lo ao esquecimento até que, fruto da poeira acumulada ou de um infeliz acidente, lhe prestemos finalmente atenção. É assim há tantos anos que talvez isso até se tenha tornado bom, agora que falo nisso.

A verdade é que, a exemplo do que infelizmente se verificou há pouco tempo, votamos ao esquecimento ou à indiferença as coisas que, tempos mais tarde são consideradas relíquias. Desde a louça da avó aos malogrados futebolistas passando, obviamente, pelos músicos e artistas. É claro que tudo isto pode ser contrariado por um toque de Midas: o facto de alguém "de fora" gostar do que temos. Aí sim! Se o vizinho do lado de lá da cerca gosta do que temos é porque o que temos é bom! Muito bom! Raciocínio lógico para as mentes mais mesquinhas, verdade?

Assim se passou com o Vinho do Porto que, cobiçado por alguns reis com um olho só, viu a atenção que lhe era dedicada redobrada. Assim se passou e assim se passa com alguns músicos, desportistas, artistas. É que são inúmeros os casos de artistas que são reconhecidos a posteriori. Depois de serem conhecidos lá fora, depois de acabarem, depois de uns anos. Depois. Mais tarde, que agora está a dar a telenovela. Fica-se com a sensação que em Portugal está tudo demasiado avançado para a época (o inventor desta desculpa merece uma estátua. Talvez uma homenagem póstuma, para ficar tudo em família).

Assim, temos bandas que poderiam ter sido projectos viáveis e produtivos que simplesmente passaram à história. Ser-lhes-á feita a homenagem, certamente, mas nada fará voltar atrás o tempo. Nada sanará a dúvida que fica no ar. a eterna pergunta: E se..? Ao que se seguem outras tantas, num exercício de adivinhação condenado ao fracasso à partida devido à irreversibilidade da situação. E porquê? Porque a nossa indústria discográfica não age. Reage, apenas. Não há investimento. Não há apostas. Não há capacidade de prever o que o público vai querer e antecipar-se, oferecendo. Há apenas uma tentativa de reacção que por vezes tem tanto de tardia como de ridícula. Assim se perdem bandas, artistas, cultura, dinheiro, vidas. Porque para haver uma reacção já houve uma acção e esta pode ser fatal. É-o para muitas bandas e vai sendo, de forma lenta mas inexorável, para a indústria discográfica. É como um cancro que a consome aos poucos. Cancro auto inflingido. Porque as coisas estão mal, há uma vaga ideia sobre isso e mais não se faz a esse respeito do que encolher os ombros e esperar por melhores dias que, sabem-no eles bem lá no fundo, dificilmente virão. Aos artistas resta o consolo de poderem ser, anos mais tarde, muitos anos mais tarde, ouvidos ou recordados com prazer e deleite redobrado, Como o bom Vinho do Porto.

Purple, músico dos The FingerTrips

2.2.04

Melhor semana de sempre!

Não gostamos muito de divulgar estas coisas, mas, desta vez não conseguimos resistir.
Na semana passada (25 a 31/1) tivemos o maior número de visitas desde que o blogue foi criado.
1.031 pessoas passaram por este espaço, que se quer de todos e onde a música portuguesa se discute de uma forma descomplexada. Queremos lançar pistas, fomentar o debate de ideias e partilhar projectos.
Aguardamos pelos vossos contributos!

Perfeição!?!

Todos os textos de António Côrte-Real estão disponiveis no Fora da Garagem


A imprensa não é perfeita, eu também não.
A minha banda não agrada a Gregos e a Troianos (alguma consegue esta proeza?) e este blogue também não.
Alguém é perfeito? Não creio.
O Blitz foi criticado no passado por “ser o jornal dos amigos”, agora é criticado por não o ser…
O Blitz é um grande jornal, a meu ver. Mas é perfeito? Não. Poderá sê-lo? Não.
Quando vivemos num mundo livre, de pensamentos e vontades, nada pode ser perfeito. E ainda bem, pois se assim não fosse, hoje, provavelmente andávamos todos vestidos da mesma cor, comíamos a mesma coisa, gostávamos do mesmo… aliás, não gostávamos nem deixávamos de gostar, limitávamo-nos a ouvir e calar… Era uma chatice ter mente robótica! Mais chato ainda era a globalização ter chegado nos anos 40, se Hitler tivesse levado a sua avante…
O Blitz está mais abrangente, fala mais de Música Portuguesa e até tem servido de meio de distribuição de discos de bandas portuguesas!
Segundo os números que me disseram, por alto, 4.500 discos vendidos de Legendary Tiger Man, via Blitz, é muito bom!
Que sirva de lição às editoras pelo preço exorbitante que cobram por um cd, num país com o nível de vida de Portugal.
Que sirva de exemplo aos lojistas que, por só terem nas suas lojas aquilo que está nos tops de vendas, não vendem (o problema é que o hipermercado também só tem estes discos… mas com um poder de compra brutal = a preços mais baixos!).
Já alguém se lembrou de falar dos armazenistas… será o trabalho destes bem feito?
Qual é a importância dos armazéns na cadeia de distribuição que faz chegar os discos ao consumidor?
Claro que a rádio que se faz hoje em Portugal também não ajuda… não é perfeita (também tem direito…), mas será a única culpada? Não me parece…
O Blitz está a mostrar que a música Portuguesa vende, se for disponibilizada nos postos de venda e se o seu preço for justo.

Entretanto, FAÇAM-ME CHEGAR OS VOSSOS TRABALHOS!!!

Próximos bandas aqui no Canal Maldito: Blind Zero, AirBugs e FingerTrips
Força!


António Côrte-Real, músico dos UHF




Podem ser enviadas demos para:
Papelaria e Tabacaria Piedense - Jubal
A/C António Côrte-Real
Largo 5 de Outubro, nº 65
2800 Cova Da Piedade