29.10.03

Os reis do quintal

Os músicos portugueses têm vindo a reclamar uma maior divulgação da produção nacional nas nossas rádios.
Curioso que esse movimento tenha surgido agora, quando se sabe que a divulgação nunca promoveu franjas significativas das edições de novos nomes.
O que terá preocupado, então, um conjunto tão vasto de compositores e de músicos, ao ponto de terem criado uma Associação?
Estarão apreensivos com a perda dos valores culturais portugueses, com a falta de apoio aos novos nomes, ou ficaram, subitamente, preocupados com o pouco airplay dos seus próprios reportórios?
É sabido que os concertos ao vivo são dominados pelos mesmos de sempre, ano após ano.
Esporadicamente, surge um “fenómeno”, como os Silence 4 ou o Pedro Abrunhosa, mas, são excepções!
Esta falta de novos nomes está relacionada com a ausência de novos projectos musicais?
Claro que não!
Temos novos grupos de sobra para que cresçam e para que se assumam, enquanto nova geração, na nossa música.
Quem se recorda das dezenas e dezenas de maquetas analisadas na extinta Revista Ritual, pergunta “onde estão, em 2003, aqueles projectos, alguns deles com grande potencial?”.
Para além de outras coisas, igualmente importantes, falta algo essencial no meio musical português.
Falta que os músicos consagrados estendam a mão aos novos valores, apostando em bandas que toquem nas suas primeiras partes.
Xutos & Pontapés ou UHF já o fizeram, ou ainda o fazem, mas, são meros exemplos num mar de excepções.
E quando tal acontece, raramente representa uma digressão completa, mas, apenas, actuações pontuais, quando as organizações dos eventos a isso estão dispostas.
Se estes nomes grandes, nas suas digressões anuais, incluíssem uma primeira parte, estariam a auxiliar a geração vindoura da nossa indústria musical.
Tal não acontece por uma questão de custos?
Não; qualquer banda nova toca por valores ridiculamente pequenos e nada significativos no bolo que qualquer nome de relevo pratica.
Mas, para que estas primeiras partes sejam possíveis, o valor do cachet do grupo de topo deve incluir, logo, todo o pacote.
Isto, porque o típico promotor português prefere poupar uns trocados, em vez de ter um espectáculo com mais qualidade e maior interesse…
Este principio pedagógico, em que músicos com maior projecção ajudassem artistas em fase inicial de carreira, poderia proporcionar uma alteração positiva.
Os pequenos grupos podiam crescer, musicalmente, ao vivo e seria mais fácil mostrarem o seu valor às editoras e ao público em geral.
Que motivos não permitem que isto aconteça?
O facto dos veteranos terem subido a pulso e sem ajuda de ninguém?
Naturalmente que isso aconteceu em 1980/82, mas, nessa altura, pouco ou nada existia na estrutura rock da nossa indústria.
Os tempos actuais são outros e a própria forma de encarar o negócio musical também.
Creio que a sensibilidade e a vontade de apoiar estão a aumentar, mas, em jeito de provocação saudável, não posso deixar de questionar:
Será que os nossos músicos veteranos e com carreira cimentada não se preocupam com o desenvolvimento e com o futuro da música portuguesa?
Ou, por outro lado, estes mesmos músicos, na sua esmagadora maioria, não querem criar condições que levem ao surgimento de novos valores?
Terão receio de perder quota de mercado nesta área de negócio?
Terão medo de deixarem de ser os reis neste quintal?

Luís Silva do Ó, jornalista

22.10.03

O Triunfo das Bolachas

É de comer e enjoar por mais.
Poderia ser este o "Slogan" de mais um festim televisivo de trazer por casa.
Mas não é. Estou a falar da Operação Triunfo, claro.
Com pompa e circunstância, "artistas" de laboratório, concebidos em 3 meses, desfilam na passerelle da fama com sonhos, ambições e, acima de tudo, muitas desilusões.
E não é de esperar outra coisa.
Num país de pretensos "cantores", toda a gente acha que pode aspirar a uma carreira musical de um dia para o outro.
O único problema é que se esquecem de que para isso é preciso ter uma coisa que não se aprende e nem se compra na farmácia: talento.
Para além disso, editoras discográficas com prestígio dão-se ao luxo de pactuar com este frenesim efémero ao editar os respectivos "álbuns", uns a seguir aos outros, aproveitando a maré de promoção que a TV e alguma imprensa sensacionalista está a dar antes que o tempo expire definitivamente para dar lugar a uma nova leva de "músicos".
Para tornar a "coisa" ainda mais surreal, a diversidade musical dos projectos não existe, ou seja, temos todos os aspirantes a tocar e a cantar o mesmo, com músicas românticas e letras sofríveis.
Se é este o empurrão que se pretende dar à música portuguesa que seja por uma ribanceira abaixo, porque assim não vamos a lado nenhum.
Só é pena é que algumas pessoas não sejam suficientemente inteligentes para perceber que não é assim que conseguirão fazer carreira, que a exposição mediática de programas como este é negativa, que não basta ter uma carinha laroca e uma voz melodiosa.
A música portuguesa precisa é de autores, de músicos que saibam compor, escrever, que saibam tocar, que saibam estar num palco, que saibam que não é em 3 meses que se compõe e produz um disco, que tudo o que é bem feito demora tempo, muito tempo.
Trabalho. É a palavra de ordem de tudo isto.
A palavra chave é Talento.
Mas essa não vem nos pacotes de bolachas, por muito que se coma.

Ulisses, músico dos Dayoff

15.10.03

Pois é... pagar para tocar

Para os mais atentos a nova música nacional tem vindo a crescer. De facto não faltam novos projectos, novas bandas, mais discos e bons músicos, mas em contrapartida não há um crescimento sustentado, ou seja as bandas crescem e depois ficam como que atrofiadas, sem espaços para progredir mais... o país é pequeno e pequenos são todos os meios que acompanham os músicos, falemos por exemplo dos concertos ao vivo:
Nos anos 80 e inícios de 90, existia um circuito que permitia às novas bandas, a então chamada música moderna portuguesa, apresentarem-se com condições remuneradas.
Uma banda de maqueta conseguia fazer cerca de 50 concertos num ano, em bares e discotecas, conseguindo cativar a atenção de um público com propensão para a descoberta, as pessoas estavam receptivas a novos sons. Esse era um dado fundamental... estar receptivo. Nos anos noventa a “moda” das bandas de versões atirou literalmente com as bandas de originais para fora do circuito... os donos dos locais e as pessoas preferiam ouvir “aquela música” que todos cantarolavam, mesmo que a banda fosse má... e acreditem havia bandas de fazer corar o mais surdo dos mortais.
O que é certo é que o circuito ficou muito apertado, sem espaço para um número cada vez maior de bandas que queriam mostrar o seu trabalho. A pergunta era sempre a mesma: “ tocam versões ? “...”não?!”, “pois assim não dá”.....
Muitas bandas não resistiram a este cenário e durante alguns bons anos a música ao vivo estagnou.
Agora é pagar para tocar... os bares não querem apostar em novas bandas e os que o fazem oferecem cachets ridículos e ou irrisórios... já não há respeito e os novos músicos têm que se sujeitar......não me venham com a “tanga” de que há que fazer... é para promover... desculpem-me mas pelo menos tem que haver dignidade. Esta mania de tocar "em qualquer condição", não eleva nem ajuda a música nacional. Depois é ver a “selva” em que se tornou o circuito de concertos: nos festivais ou pagam pouco ou então paga-se... sim paga-se.... nas recepções e queimas das fitas o sistema é o mesmo "é pá vão tocar para muita gente...fazer a primeira parte de um grande artista" ( seja lá isso o que for). E as bandas aceitam!!! Mesmo que se saiba que no final o promotor fez uma pipa de massa, pagou um gordo cheque ao tal "cabeça de cartaz", e ainda sobrou para umas boas férias... um carro...

A música é uma arma e a luta continua.

CALV

9.10.03

Cromos que não descolam

Guardo memórias muito positivas das cadernetas de cromos que coleccionei, há muitos anos atrás.
Recordo-me que, em qualquer caderneta, existiam, sempre, alguns cromos mais raros e que dificultavam o finalizar da colecção: eram cromos raros, mas, bons.
Quando a infância e a adolescência se fartaram de mim, essas cadernetas sumiram da minha vista.
O estranho é que, à medida que isso foi acontecendo, os cromos de papel foram sendo substituídos pelos cromos de carne e osso.
Dizer que Portugal é um pais com muitos cromos, não é novidade para ninguém.
A música, então, é um mundo cheio de cromos…
Sem esquecer os cromos que existem em maior fartura (organizações “manhosas”, intermediários “duvidosos”, etc, etc, etc…), tenho especial aversão a uns, em particular.
Refiro-me aos maus críticos, àqueles que escrevem umas coisas e que destroem outras.
Julgo que todos os trabalhos musicais merecem respeito, mesmo aqueles que são, na minha visão, muito maus.
Ao analisar um novo álbum, é essencial saber “escutar” e saber “avaliar”. Depois, é necessário ter a arte, a sensibilidade e o engenho de colocar, no papel, uma opinião sólida, válida e honesta sobre esse CD.
Redigir críticas discográficas às dúzias, enquanto se realizam reportagens de concertos e entrevistas avulsas, não pode possibilitar tempo suficiente para uma audição de todos os CD’s, sobre os quais se devem emitir opiniões. Nem permitirá que o crítico escute trabalhos anteriores do artista em questão ou que se documente sobre o mesmo, numa busca de informação e de contextualização musical.
Qualquer artista, mais jovem ou veterano, pode ver a sua carreira em cheque por uma crítica menos séria.
O que me preocupa não são as opiniões lúcidas e correctas, negativas ou positivas, mas, tão só, a falta de profissionalismo e de respeito como muitas outras são feitas.
Dizer que um artista veterano está “senil” ou que um grupo novo “devia ir trabalhar nas obras” são opiniões que não pertencem à categoria de “crítica discográfica”.
Seria interessante verificar que formação e conhecimentos musicais possuem tais pessoas…
Pessoas, que aparecem vindas do vazio e que acabam por desaparecer, deixando mau rasto…
Isto porque uma análise negativa, apresentada de uma forma destrutiva, num jornal de grande âmbito, pode ser motivo suficiente para que um grupo, numa primeira edição, veja a sua vida desaparecer.
Estes são os cromos que prejudicam qualquer colecção.
E, ao contrário dos que tinha de colar nas cadernetas, são frequentes e maus.

Luís Silva do Ó, jornalista

7.10.03

Inquérito a Animadores Radiofónicos - Resultados Finais

A questão da divulgação de música portuguesa, pelas principais estações de rádio, continua na ordem do dia. Na passada semana, foi aprovada nova legislação e o tema tem apaixonado intervenientes e dividido opiniões.
O Canal Maldito elaborou um pequeno inquérito com 7 questões e contactou 49 animadores radiofónicos de rádios locais, obtendo resposta em 22 dos casos.
Este inquérito decorreu entre 15 e 23 de Setembro e agradecemos aos animadores que connosco colaboraram.
Não foi nossa intenção aprofundar a questão, pois, podíamos correr o risco de “ter mais olhos do que barriga”.
Consideramos que os radialistas, que têm a “mão na massa”, possuem importante e essencial contributo nesta questão da música portuguesa, tendo um conhecimento lúcido e valioso, fruto do seu dia-a-dia profissional.
Quando um destes animadores divulga uma canção, abre uma janela sonora a quem a escuta.
É o genial mundo da fantasia que a rádio possibilita.
Recordamo-nos de tantos êxitos saídos das mãos destes profissionais!
Aliás, esta conversa faz-nos lembrar uma compilação recentemente editada, dedicada ao rock português que reúne temas de 1980 até 1984. Muitos deles foram grandes sucessos e proporcionaram vendas chorudas às editoras.
Neste CD, constam músicas como “Chico Fininho”, “Cavalos de Corrida”, “Chiclete”, “Patchouly” ou “Portugal na CEE”.
Foi um momento importante, o vivido em 1980/82, mas, uma dúvida faz-nos estremecer…
Caso, em 1980, as rádios nacionais estivessem formatadas pelo actual modelo, teria existido “boom” do rock português?
Artistas como GNR, Xutos & Pontapés, UHF, Rui Veloso ou Rádio Macau teriam singrado no meio musical?
Será que a música moderna portuguesa existiria em 2003?

Persona Non Grata & Um Mau Rapaz

(texto de 2003/10/01)

Pergunta nº 7

A diminuição nas vendas globais de discos deve-se a:
(indicar os 3 principais motivos)

Cópias de músicas pela Internet – 86,36%
Pirataria de discos – 54,55%
Preço elevado dos discos – 50,00%
Falta de divulgação das rádios nacionais – 45,45%
Falta de promoção das editoras – 27,27%
Outras razões – 22,73%
NS/NR – 13,64%

(22 respostas obtidas; NS/NR - Não sabe ou não responde)

6.10.03

Pergunta nº 6

Considera que o tema "A Lágrima Caiu" dos UHF é comercialmente forte?

SIM - 72,73%
NÃO - 18,18%
NS/NR - 9,09%

(22 respostas obtidas; NS/NR - Não sabe ou não responde)

5.10.03

Pergunta nº 5

Os UHF lançaram recentemente um novo disco que não passa nas rádios nacionais. Considera que o tema "A Lágrima Caiu" devia ser divulgado pelas rádios nacionais?

SIM – 86,36%
NÃO – 9,09%
NS/NR – 4,55%

(22 respostas obtidas; NS/NR - Não sabe ou não responde)

4.10.03

Pergunta nº 4

Os grupos RR e MCR apostaram num formato de rádio baseado em playlists, com mais música e menos intervenção dos animadores radiofónicos. Considera este o formato correcto para a rádio do futuro?

SIM – 4,55%
NÃO – 90,90%
NS/NR – 4,55%

(22 respostas obtidas; NS/NR - Não sabe ou não responde)

3.10.03

Pergunta nº 3

É normal que um disco seja um sucesso de vendas se as rádios nacionais não divulgarem esse trabalho?

SIM – 27,27%
NÃO – 72,73%

(22 respostas obtidas)

2.10.03

Pergunta nº 2

Quando uma rádio nacional aposta e divulga um música nova, considera que essa divulgação tem influência directa nas vendas desse disco?

SIM – 90,91%
NÃO – 9,09%

(22 respostas obtidas)

1.10.03

Pergunta nº 1

Considera que as rádios nacionais deviam fazer uma maior divulgação dos novos discos de música portuguesa que são editados?


SIM – 95,45%
NÃO – 4,55%

(22 respostas obtidas)